O Luto

Um trabalho de Sandra Rodrigues


AJUDAR DE MODO SAUDÁVEL OS SOBREVIVENTES DO SUICÍDIO

O historiador Arnaold Tonybee uma vez escreveu, “existem sempre duas partes na morte; a pessoa que morreu e os que sobreviveram”. Infelizmente, muitos sobreviventes do suicídio sofrem sozinhos e silenciosamente. O silêncio que os rodeia complica a recuperação e o encorajamento para sofrer.

Por causa do estigma social que circunda o suicídio, os sobreviventes sentem a dor da perda, contudo sem saber como, ou como, ou se, deveriam expressar isso. Mas o único modo de recuperar é ainda o sofrimento. Tal como outras pessoas que perderam alguém que amavam, os sobreviventes do suicídio necessitam falar, chorar, às vezes gritar, para recuperarem.

Como resultado do medo e de serem mal entendidos, os sobreviventes do suicídio sentem-se frequentemente abandonados quando precisam desesperadamente de apoio incondicional e que os entendam. Sem dúvida, os sobreviventes do suicídio sofrem de muitas maneiras; um, porque precisam de sofrer a perda da pessoa que faleceu; dois, porque tiveram a experiência de uma morte traumática, súbita, inesperada; e, três, porque são evitados por uma sociedade pouco disposta a entender a dor do luto deles.

Como Pode Ajudar?

Se quer ajudar um amigo ou um membro da família que passou pela experiência da morte por suicídio de alguém amado, este artigo irá guiá-lo de modo a transformar os seus cuidados e preocupações em acções positivas.

Aceite a Intensidade da Dor

O sofrimento que se segue a um suicídio é sempre complexa. Os sobreviventes não “superam isso”. Pelo contrário, com apoio e compreensão, podem recuperar-se si mesmo com essa realidade. Não se surpreenda com a intensidade do sofrimento deles. Às vezes, quando menos esperam, estão subjugados ao seu sofrimento. Aceite que os sobreviventes ao suicídio possam estar a lutar contra emoções fortes, como a culpa, o medo e a vergonha – sentimentos, todos eles, bem mais fortes experimentados noutros tipos de morte. Seja paciente, compassivo e compreensivo.

Ouça Com o Coração

Dar assistência a sobreviventes do suicídio significa que tem de acabar com o terrível silêncio. Ajudar começa com a sua capacidade para ser um ouvinte activo. A sua presença física e o seu desejo de escutar sem criticas ou julgamentos são ferramentas preciosas. O desejo de ouvir é a melhor ajuda para quem precisa de falar.

Pensamentos e sentimentos do sobrevivente podem assustar e ser difíceis de compreender. Não se preocupe demasiado com o que deve dizer. Concentre-se apenas nas palavras que estão a ser partilhadas consigo.

O seu amigo pode repetir a mesma história sobre a morte vezes sem conta. Ouça atentamente cada uma delas. Compreenda que esta repetição faz parte do processo de recuperação do seu amigo. Apenas escute e compreenda. E, lembre-se, não tem de ter as respostas para as perguntas dele. Ouvi-las é quanto basta.

Evite Explicações Simplistas e Clichés

Palavras, especialmente clichés, podem ser muito dolorosas para um sobrevivente ao suicídio. Frequentemente, os clichés são comentários muito utilizados que pretendem diminuir o sentimento de perda provendo soluções simples para realidades difíceis. Comentários como, “Estás a portar-te muito bem”, “O tempo curará todas as feridas”, “Pense nas coisas boas da vida”ou “Tens de ser forte para os outros” não são construtivos. Pelo contrário, magoam e tornam o processo do luto mais complicado.

Evite julgamentos ou explicações simplistas relativamente ao suicídio. Não cometa o erro de dizer que a pessoa que se suicidou “não estava consciente”. Informar um sobrevivente que alguém que amava estava “louco ou insano” complica ainda mais a situação. Os sobreviventes do suicídio precisam de ajuda na sua própria procura para compreender o que aconteceu. No final, a sua procura pessoal de significado e compreensão da morte é que é realmente importante.

Seja Compassivo

Dê autorização ao seu amigo para expressar os sentimentos dele sem medo de critica. Aprenda com o seu amigo. Não dê instruções ou explicações de como devia comportar-se. Nunca diga, “Sei como te sentes”. Não sabe. Pense no seu papel como alguém que “caminha com”, não caminha “atrás de “ ou “à frente de”.

Familiarize-se a si mesmo com o grande espectro de emoções que muitos sobreviventes do suicídio experimentam. Permita que o seu amigo sinta todo o sofrimento, tristeza e dor que está a sentir no momento. E reconheça que as lágrimas são a expressão apropriada e natural associada à perda.

Respeite a Necessidade do Luto

Frequentemente ignorados no seu sofrimento são os pais, irmãos, irmãs, avós, tios, cônjuges e crianças das pessoas que cometeram o suicídio. Porque? Porque devido à natureza da morte, às vezes, é mantida em segredo. Se a morte não pode ser falada abertamente, dificilmente as feridas do sofrimento irão recuperar.

Pode ser a única pessoa que está próximo dos sobreviventes, como amigo atencioso. A sua presença física e o facto de ouvir de forma permissiva podem criar o alicerce para o processo de recuperação. Permita que os sobreviventes falem, mas não os force. Às vezes, pode dar uma sugestão e esperar. Se receber um sinal do que precisam, deixe-os perceberem que está lá para os ouvir, e quando, eles quiserem podem partilhar os seus pensamentos e sentimentos.

Compreenda a Singularidade da Dor do Suicídio

Lembre-se que o sofrimento dos sobreviventes do suicídio é único. Ninguém sente a morte de alguém que amou exactamente da mesma maneira. É possível falar com outras pessoas, que também passaram por situações idênticas, sobre algumas fases semelhantes, mas todas as pessoas são diferentes e passaram por experiências de vida únicas.

Porque a experiência do luto é única, seja paciente. O processo do luto leva o seu tempo, assim permita ao seu amigo fazer o luto ao seu ritmo. Não critique o comportamento dele. Lembre-se que a morte por suicídio de alguém é uma experiência muito pesada. Como resultado dessa morte, a vida do seu amigo está em reconstrução.

Esteja Atento aos Dias de Descanso e Aniversários

Para os sobreviventes do suicídio, as ocasiões especiais como os dias de descanso e os aniversários podem ser momentos difíceis. Estas ocasiões enfatizam a ausência da pessoa que faleceu. Respeite essa dor como uma fase natural do processo de luto. Aprenda com isso. E, muito importante, nunca tente diminuir essa dor.

Use o nome da pessoa que faleceu quando falar com os sobreviventes do suicídio. Ouvir esse nome pode ser reconfortante, e confirma que não esqueceu essa pessoa especial que significou tanto na vida deles.

Esteja Atento aos Grupos de Apoio

Os grupos de apoio são uma das melhores maneiras de ajudar os sobreviventes do suicídio. Num grupo, os sobreviventes podem comunicar com outras pessoas compartilham uma experiência similar. Permite-lhes e encoraja-os a contar as suas histórias como querem e gostam. Pode ajudar os sobreviventes a procurar um grupo de apoio. Este esforço da sua parte será apreciado.

Respeite a Fé e a Espiritualidade

Se deixar, os sobreviventes irão “ensinar-lhe” sobre os seus sentimentos de fé e espiritualidade. Se a fé faz parte da vida deles, deixe-os expressar isso da maneira que acharem mais correcta. Se eles estiverem furiosos com Deus, encoraje-os a falarem sobre o assunto. Lembre-se, que ter raiva de Deus demonstra ter uma relação com Deus. Não faça julgamentos, seja um amigo compreensivo e atencioso.

Os sobreviventes podem também necessitar explorar como a religião pode ter complicado as suas vidas. Podem ter sido ensinados que as pessoas que acabam com a sua própria vida vão parar ao inferno. A sua tarefa não é explicar teologia, mas ouvir e aprender. Em qualquer situação, a sua presença e desejo de escutar sem criticas são as suas ferramentas para ajudar.

Trabalhe em Conjunto Como Ajuda

Os amigos e família de alguém que se suicidou não devem sofrer sozinhos e em silêncio. Como ajuda, pode tentar juntar outras pessoas atenciosas para darem apoio e aceitarem os sobreviventes de modo a que sofram de maneira saudável.

A experiência da dor do luto é o resultado de amar. Aos sobreviventes do suicídio devem ser garantidas esta necessidade. É importante lembrar, que ajudar um sobrevivente do suicídio na sua recuperação não é uma tarefa fácil. Pode ter que dar mais o tempo, o amor e a preocupação que alguma vez já deu. Mas este esforço terá ainda mais valor.